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segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Heroinas que saem do armário vivem plenamente.

por Lúcia Facco em Frente e Verso

Recebi uma mensagem, pelo Orkut, de uma leitora. Ela comentou que ficou curiosa para saber a respeito do grupo Umas & Outras, que cito no livro As Heroínas saem do armário: literatura lésbica contemporânea. Respondi, então, que este grupo perdeu a sede, mas algumas meninas (eu, inclusive) manteve contato através de um grupo de discussão e, atualmente, tem realizado encontros de ajuda mútua.

O Umas & Outras chegou a ter um site, no qual eu tinha uma coluna. Fiquei saudosa desse tempo e resgatei do fundo do baú (quer dizer, nos arquivos do meu PC) alguns textos publicados no extinto site. Resolvi publicar no Parada Lésbica o primeiro deles, não sei se por pura nostalgia, ou por perceber como ele continua atual, mesmo depois de 6 anos.

O texto é o seguinte:

Meu nome é Lúcia Facco. Concluí neste ano o curso de Mestrado em Literatura Brasileira, na Universidade do Estado do Rio de Janeiro, sob a orientação do Prof. Dr. Ítalo Moriconi. O título da minha dissertação foi “Boca no trombone: Literatura lésbica contemporânea”. Enfoquei textos de autoras brasileiras que estão escrevendo sobre relações lésbicas de maneira clara, aberta, sem subterfúgios. Fui convidada por Valéria Melki Busin e Laura Bacellar para assinar uma coluna no site do Grupo Umas e Outras. Devo dizer que fiquei muito honrada com esse convite e muito feliz por poder, de alguma maneira, contribuir para a diminuição do preconceito sofrido e das inúmeras dificuldades enfrentadas pelas mulheres lésbicas nesta nossa sociedade. Espero dar conta deste compromisso com competência e responsabilidade.

A inspiração para o primeiro texto surgiu de um fato no meu cotidiano: recebi um texto escrito por uma amiga para apreciação. Ele está extremamente bem escrito e sua autora tem vinte anos. Fiz questão absoluta de dizer a ela o quanto gostei dele. Lembrei de mim, aos 16 anos (há muito tempo atrás, em uma galáxia distante). Uma professora de redação mandou que a turma escrevesse sobre “o livro”. Eu, como contadora de “causos” que sempre fui, escrevi uma história sobre uma criança que se via às voltas com a limpeza da estante de livros do pai. O texto continha diálogos, reflexões da personagem, enfim… A professora me presenteou com a pior nota que podia. Fui argumentar com ela, pois estava perfeitamente ciente da boa qualidade do texto. Ela então me respondeu que a nota baixa se devia ao fato de meu texto não possuir o formato exigido para uma redação: um parágrafo de introdução, dois ou mais de desenvolvimento e um de conclusão. Discuti com ela, dizendo que ela deveria considerar a criatividade mais do que o formato, pois qualquer um pode seguir uma receita, porém nem todos o fazem com competência. Essa discussão quase me valeu uma reprovação. O resultado disso tudo foi que eu aposentei a caneta por muitos anos. Continuei lendo muito, porém deixei de escrever, positivamente convencida de que eu não sabia fazê-lo.

Quando fui escrever a minha dissertação de Mestrado, me deu uma louca e eu resolvi que escreveria um texto ficcional. Ou seja, totalmente fora do molde normalmente exigido pela Academia. Acho que queria me testar, pois, depois de tanto ler e estudar Literatura, novamente me sentia capaz de produzir um texto literário de qualidade. Felizmente encontrei no meu orientador uma pessoa que possui uma abertura de pensamento que o permite não só aceitar, mas apreciar idéias novas.

Encarei o desafio e, felizmente fui aprovada com distinção e meu texto vem sendo lido e bastante elogiado. Menos de um mês após a defesa de dissertação, recebi um convite da Laura Bacellar (editora responsável pelas Edições GLS) para publicá-la.

Trocando em miúdos, contei essa história toda, pois fiz uma relação entre o que aconteceu comigo e a experiência de se viver relações homossexuais. Na grande maioria dos casos, quando sentimos pela primeira vez, um desejo homossexual, ficamos desconcertadas e confusas, pois é algo considerado “fora dos padrões sociais de comportamento”. Ao nos relacionarmos com outra mulher, estamos escrevendo uma história sem “introdução, desenvolvimento e conclusão”. Por isso quis contar a minha historinha pessoal, pois ela serve para mostrar que histórias escritas fora dos padrões vigentes geralmente são muito mais criativas, corajosas, interessantes.

Há muitas pessoas como aquela professora dos meus 16 anos, que têm muita dificuldade em perceber que o mundo não cabe mais dentro de moldes, padrões fixos e imutáveis. Ele é muito maior. E cabe a nós mostrar-lhes isso.

Fiquei feliz por constatar que, se ele continua atual em relação à necessidade de buscarmos novas experiências, novas “escritas” em nossos caminhos de vida, por outro lado, muita coisa mudou no mercado editorial, no que diz respeito às lésbicas.

Em 2009 a primeira editora exclusivamente voltada para as mulheres lésbicas (Editora Malagueta) completou um ano de vida, com várias publicações, o que demonstra que ela veio para ficar; a Summus continuou publicando livros voltados para as minorias sexuais (incluindo a minha tese de Doutorado – Era uma vez um casal diferente); a quantidade de textos escritos por lésbicas, publicados na internet tem crescido bastante.

O balanço foi muito bom, o que comprova que as meninas estão danadas, escrevendo e lendo como nunca.

Fico muito feliz, pois é um sinal de que as coisas estão mudando para melhor. A visibilidade está aumentando e a coragem também (não necessariamente nessa ordem).

Parabéns para todas! Parabéns para nós! Que 2010 seja mais um ano cheio de conquistas, alegrias, amor e prazer.

Compre e leia o livro de Lúcia Facco – “As heroínas saem do armário” clicando aqui.


http://www.paradalesbica.com/



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