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domingo, 20 de outubro de 2013

Acorda, mulher! A vida não é um fogão.

Dona Maria é uma mulher seca. Não de braço – estes, fortes, sustentam o mundo -, mas seca de vida. Quatro filhos, uma casa, uma mãe para cuidar e um marido violento. Operária, acorda cedo todos os dias. É explorada. Em casa, mais uma jornada de trabalho. Dona Maria não sabe, mas ela é uma dentre as muitas marias que vivem assim.
 A revolução interna, porém, inda que miúda, é o passo mais significativo para destruir a exploração – inclusive a doméstica. A consciência da injustiça, da secura de vida, da dificuldade dolorosa que rege a vida feminina em um complexo universo machista e misógino, fará marias arregaçarem as mangas da blusa, dobrar aventais e ir para a luta. “Lugar de mulher é onde ela quiser” e toda Maria deve querer estar às ruas; amar as ruas – sua segunda casa -, a foice e o martelo.
Mulheres já nascem culpadas. Culpadas por serem agredidas. Culpadas por serem estupradas. Culpadas pelo desrespeito que sofrem. Culpadas da culpa que rege suas vidas. Os números gigantes sobre os crimes contra as mulheres assustam menos que as declarações sobre elas: “Apanha do marido por que gosta de apanhar”, “foi estuprada por causa do tamanho da saia”, “ninguém mandou beber”, “não se dá o respeito”... De frase em frase, constrói-se um muro de injustiça que multiplica a opressão.
O anseio de sentir-se inteiramente livre e humanamente respeitada, no entanto, caminha de mãos dadas com a luta de classes. Somente em uma sociedade em que não existam exploradores e explorados, a mulher poderá se sentir inteira. Somente com a superação do Capital, a mulher será mulher. Não ‘mulher’ tal qual Amélia, tal qual escrava, tal qual feita aos moldes machistas para servir ao seu amo; mas mulher livre, mulher que luta, mulher dona de si.
Assim que reconhece não haver liberdade em um sistema que cria escravos de seus produtos, de suas criações, a mulher assume fundamental papel na luta contra o patrão. “Que nada nos defina, que nada nos sujeite”, disse Simone de Beauvoir, “Que a liberdade seja a nossa própria substância”. A liberdade, mulher, residirá em ti, em nós, assim que a classe de exploradores deixar de explorar; assim que a classe de explorados tomar o poder.
Não, mulher, tu não foste feita para pilotar fogão. Será pilota de tuas vontades, de teu corpo, de tua liberdade. Não mais será objeto da mídia, mas fará com que a mídia propague o respeito por tuas curvas – estas, à mostra, ou não. Não sofrerá com padrões de beleza impostos, nem sentirá culpa quando violentada for. Assuma a luta, mulher: a vida não é um fogão.


Clarissa Damasceno Melo
Estudante de Letras - UESC

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